Como Surgiu a Gravata – História da Moda Masculina

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Como Surgiu a Gravata

A gravata pode ser considerada o mais masculino dos acessórios, nada simboliza tão bem a moda masculina como ela, mas pouca gente sabe como surgiu a gravata moderna e a trajetória para que ela se tornasse um ícone de elegância e sofisticação.

Como surgiu a gravata

Registros mais antigos

Desde início dos tempos temos indícios de que os homens sempre tiveram o costume de usar algum tecido em volta do pescoço seja para proteger do frio, como sinal de status, um símbolo religioso ou simplesmente uma forma de complementar a vestimenta.

Um dos registros mais antigos vem dos egípcios, cujo amuleto chamado “Sangue de Isis” era feito de ouro ou cerâmica e tinha a forma de um cordão com nó, ele era colocado no pescoço das múmias e sua função era proteger dos perigos da eternidade. Na China um pedaço de pano similar a um cachecol preso por um nó era usado há milhares de anos como símbolo de status por oficiais das tropas do imperador Shih Huang Ti. O focale era usado por oradores romanos na época do Imperador Trajano (53-117) com o intuito de aquecer suas gargantas. Contudo a peça como é conhecida hoje pode ser, inicialmente, fruto da praticidade dos croatas unida ao senso fashion dos franceses.

Na Europa do século XVII – O Cravate

Como Surgiu a Gravata - O Cravate

A versão mais aceita para o surgimento e popularização da gravata remonta a Guerra dos 30 anos (1618-1648) quando a chegada de mercenários croatas a França chamou atenção da população local para um detalhe: o lenço que eles traziam amarrado ao pescoço e que servia, entre outras coisas, para manter o colarinho do uniforme fechado e alinhado, sendo também um delimitador de status, com os soldados usando tecido rústico e os oficiais ostentando seda e algodão. Há quem acredite que no campo de batalha o lenço tinha uma serventia mais nobre, pois era útil para estancar sangramentos ou para cobrir ferimentos (como uma gaze) mas a verdade é que alguns historiadores contestam essa afirmação. Eu não me espantaria com isso, a história nos mostra que na moda masculina a utilidade sempre esteve acima de status ou estética.

Origem do nome

Os croatas se auto denominavam Hrvati, os franceses pronunciavam Croates, da união dos dois termos nasceu a palavra que viria a definir esse tipo de acessório: cravate. Hoje o cravate é um tipo específico de adorno usado no pescoço. Com um nó bem semelhante ao da gravata moderna, o cravate é feito de tecido volumoso e ainda é usado em trajes pomposos para casamentos por causa de seu visual clássico que remete a nobreza das cortes em séculos passados.

Não fica difícil imaginar que a corruptela de cravate gerou a palavra em português para a gravata que conhecemos hoje. Nos países de lingua inglesa o nome é bem mais simples: necktie (nó ou laço de pescoço) ou apenas tie (nó ou laço).

Popularização do cravate

Como Surgiu a Gravata - O Cravate e Luiz XIV

Em 1649 o jovem Luiz XIV, então com 7 anos, começou a usar um lenço de renda no pescoço, provavelmente influenciado pelo que havia visto durante a presença dos croatas, e, provando-se um trendsetter de mão cheia, acabou levando a moda a toda corte. Logo homens e mulheres aderiram ao tecido ao redor do pescoço, amarrando- em um laço elaborado e elegante ou prendendo-o com um cordão.

Anos depois soldados ingleses em campanha na Itália entrariam em contato com o cravate e levariam a moda para as ilhas britânicas e depois para sua colônia na América.

Mais neckwear – Stocks

A partir de 1715 surgiram os stocks, que a principio eram uma faixa de musseline que cobria todo o pescoço, evoluindo depois para uma espécie de “neck corset” de couro usado pelos militares para manter a postura durante a ordem unida, além de proteger as principais artérias durante um combate com baionetas ou sabres.

Os stocks de tecido eram presos na parte de trás por uma presilha, fita ou fivela, mas depois surgiram os modelos com o tecido se cruzando na parte de trás e fechando na frente com um laço. A popularização do stock e as diversas maneiras de amarrar a peça foram um segundo passo em direção a criação da gravata moderna e, como você já deve ter imaginado, da gravata borboleta, basta ver as fotos alguns dos laços dados para prendê-lo.

Com o sucesso do acessório diversas maneiras de amarrá-lo foram surgindo, eram nós complicados que tomavam bastante tempo e necessitavam de cuidado para que ficassem impecáveis. Publicações da época que mostravam diagramas ensinando as várias opções de amarração tornaram-se guias para muitos homens vaidosos.

Evolução – O ascot

No século XIX o homem se tornou mais prático, não havia mais tempo para se perder com roupas complicadas e acessórios que sujavam e restringiam movimentos. A moda masculina se tornou austera depois que homens como Beau Brumell, considerado o primeiro dândi, mostraram que menos era mais. A chegada da Revolução Industrial (1820-1840) exigia praticidade dos novos burgueses que dirigiam fábricas e dos trabalhadores que faziam trabalho braçal.

Rendas e babados definitivamente não eram tendência na época, os trajes elaborados foram simplificando e se aproximando do terno que temos hoje. Então em 1880 o ascot, uma alternativa ao stock, mais estreito e com uma única volta em torno do pescoço, tornou-se padrão para trajes diurnos. O acessório se tornou centro das atenções quando o Rei Eduardo VII o vestiu para ir as corridas The Royal Ascot, daí vem o nome!

Surgimento da gravata moderna

Os adereços de pescoço masculinos foram ficando cada vez mais simples e menos volumosos, seguindo a tendência do restante das roupas da época e muitas pessoas de língua inglesa já se referiam a eles somente como “tie”, até nos anos 20 Jesse Langsdorf, um “tie maker” de Nova York, teve a ideia de fazer uma gravata com 3 pedaços de tecido, cortando a ponta em um bico com ângulo de 45 graus, dando a luz a gravata como conhecemos e fabricamos hoje em uma técnica chamada de “construção resiliente”. Antes disso as gravatas eram compridas o suficiente apenas para ficarem presas sob o colete, ou seja, mal chegavam ao fim do tórax, tinham que ser fixadas com um pin ou clip e amassavam facilmente, pois não possuiam a entretela e a costura usada atualmente para manter sua forma, facilitando também o nó.

Com o novo formato e suas vantagens a gravata tornou-se mais versátil, agora era possível vesti-la apenas com um blazer, abrindo caminho para sua presença não só na moda formal masculina, mas também na moda casual.

Os já citados stocks eram feitos de linho, esse tecido deu lugar a seda com a chegada do ascot, que, apesar de caro, continuou a agradar por muito tempo, contudo a gravata moderna conseguiu se moldar aos novos tempos e quando a II Guerra Mundial limitou os recursos, o rayon, tecido derivado da fibra de celulose, conhecido também como seda artificial, passou a ser o mais usado em gravatas, muitas vezes pintado a mão com temas que iam do equestre a pin-ups e florais.

Como Surgiu a Gravata - Beatles

Nos anos 30 e 40 as gravatas eram mais largas, acompanhando o traje social e o caimento típico dessa época, somente na década de 60 que a gravata skinny surgiu graças aos ternos slim fit, sendo impulsionada por ícones do cinema e da música que adotaram a novidade prontamente, como os Beatles, por exemplo. Nos anos 70 elas alargaram de novo e se tornaram extravagantes, ostentando desenhos psicodélicos, padrões grandes e muitas cores. Foi nos anos 80 que as gravatas com listras transversais (regimental stripes), poás e micro estampas se tornaram amplamente difundidas e utilizadas, assim como os modelos em crochê, opção dos jovens yuppies e artistas descolados.

Apesar de tão importante na moda masculina, a gravata acabou ganhando a pecha de acessório de trabalho e indumentária de executivo, esse pensamento a afastou do público jovem, por muito tempo ela foi vista como “um acessório careta para pessoas quadradas”. No final dos anos 90 isso sofreu um revés que aconteceu em parte por conta dos publicitários que resolveram adotar gravatas com desenhos divertidos, muitas vezes fazendo referência a cultura pop, o que não deixava de ser cafona, mas serviu para tirar a cara sisuda da peça. Outros que tiveram um papel fundamental para aproximar a gravata da juventude foram bandas como o Greenday, entre tantas outras, que resolveram adicionar um elemento ao visual rocker, mostrando que a versatilidade ainda estava latente na boa e velha gravata.

No início do século XXI a gravata skinny voltou com tudo, catapultada pelo uso maciço de roupas masculinas com caimento mais justo e lapelas mais delgadas que exigiam um acessório condizente com as proporções do slim fit. Na sequência surgiram ícones do estilo, incluindo aí esportistas, músicos, modelos, blogueiros e atores, mostrando como usá-la no dia a dia em combinações casuais incríveis e modernas. Pronto, a gravata havia reconquistado seu lugar de destaque no guarda roupas do homem contemporâneo, vencendo preconceitos e estigmas.

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Notas do autor

  1. No Brasil se usa a palavra cravate para denominar a peça usada no pescoço quando os noivos optam pela casaca ou smoking ao invés do terno convencional. Trata-se de uma espécie de gravata, mas com tecido mais volumoso e que dá uma efeito visual clássico, lembrando roupas solenes do passado.
  2. Não desenvolvi aqui a história da gravata borboleta que vai seguindo paralelamente com a da gravata padrão, prefiro falar disso em um artigo a parte.

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